Cuidado com os seus desejos.

Nos meus momentos de estresse, fúria e raiva domésticos, muitas vezes me peguei falando alto: "quero férias de filho e de marido!". Não foram muitas mas reconheço que algumas vezes explanei esse pensamento e esse desejo em voz alta.

O Universo, danado, vive brincando com os meus desejos. E eu ainda não aprendi que preciso explicar direitinho, detalhe por detalhe, vontade por vontade: "Queria férias domésticas, de marido e filho, nas Maldivas, com um vôo super tranquilo (na ida e na volta), uma acomodação bacana, com uma vista maravilhosa, drinks deliciosos, massagem relaxante, comida prontinha no café da manhã, almoço e jantar. Gostaria de tudo isso muito bem acompanhado de  dias de sol e calor suficientes para pegar uma corzinha. Um mar limpo, de água quentinha e sem muitos bichinhos. Queria também um celular com um sinal não muito bom ... apenas o suficiente para saber notícias dos meus meninos, que ficariam por aqui, morrendo de saudades, sentindo uma falta tremenda e tendo a certeza de que a vida sem mim realmente era muito sem graça."

Era para ter pronunciado isso num tom firme, forte e convincente.

Mas não. Pedi férias de marido e filho. Só isso. Uma mera frase com cinco palavras.

Pronto. O Universo foi lá e disse:

- "Tá bom, Tatiana! Seu desejo é uma ordem".

Eis então que quinta-feira passada os dois - num intervalo de algumas poucas horas de diferença - depois de escaparem por quase 3 anos, testaram positivo para o Covid.

Por sorte a casa é grande e cada um ficou num quarto com todo o conforto e comodidade. Vez que outra, quando aparecia o tédio, eles se juntavam para bater papo, comer, assistir filmes, brigar ... enfim ... aquela convivência nem sempre maravilhosa entre pai e filho.

No primeiro dia fiquei aliviada. Aquele mantra de "agradecer inclusive pelos perrengues". Que bom que isso aconteceu depois de todas as vacinas, de maneira leve, numa casa cômoda, sem eu precisar dividir o banheiro com eles. E que bom que estavam podendo compartilhar a companhia um do outro.

Me esforcei em fazer menus legais, gostosos e diferentes, de acordo com o gosto individual dos meus meninos. Eu não gosto de cozinhar mas fiz tudo com dedicação e amor. Sempre de máscara, lavando as mãos direto e tendo todos os cuidados possíveis.

Eu estava ótima e vez que outra debochava deles (eu sou malvada, acho que vocês já sabem).

Porém a minha liberdade era basicamente limitada pelos cômodos da casa. Apesar de em teoria não estar com a obrigação de quarentena ou isolamento (fiz testes que deram negativo) acabei saindo de casa somente num dia para comprar xarope para a tosse persistente do Pequeno.

No segundo dia começou a bater um cansaço. Não. Não era sintoma. Era cansaço de cozinhar o dia inteiro. E, tenho que ser sincera, a casa estava um tédio. Eles estavam mas não estavam. Ninguém para desarrumar as almofadas do sofá, ninguém para deixar pratos e copos espalhados pela casa, ninguém pra deixar meias jogadas por aí. Ninguém pra fazer zappings intermináveis na Netflix, ninguém pra passar creme em minhas pernas.

Da cozinha escutava os dois batendo papo, dando risadas e tudo o que queria era tê-los comigo. As refeições sozinha foram chatas pra caramba.

Até cogitei  liberar a casa para todo mundo. "Pego essa droga também e azar". Mas logo pensava que havia aguentando até agora levando várias cutucadas no nariz e todas dando negativo.

Acabei o vinho que havia ficado aberto (não dá pra desperdiçar, né?!) mas não abri outro. Minha melhor companhia para beber estava trancada no quarto, tomando água e suco de laranja. Não tinha graça.

Na terceira noite com a cama todinha pra mim não consegui dormir direito. Apareceu uma dorzinha de garganta "diferente" e uma dor nas costas chata e persistente.

Estava na dúvida se iria até Milão votar ou não (apesar da dra. dizer que estava "liberada" me sentia incomodada com a possibilidade de estar levando o vírus por aí), resolvi fazer um teste (desses que a gente faz em casa mesmo). Me sentia melhor, apesar de um incômodo na garganta (mas isso costumo sentir quando minha sinusite ataca). Um riscão apareceu bem forte (aquele que diz que é negativo). Alguns minutos depois (bem mais do que o tempo indicado) apareceu um tímido risquinho, que seria a confirmação de positividade. Mas o risquinho era tão tímido, quase imperceptível que achei que fosse coisa da minha cabeça.

Na dúvida, bora pra farmácia confirmar o resultado ou não. Em caso de resultado negativo, havia decidido que iria votar.

Cheguei na farmácia, que estava lotada, esperei alguns bons minutos e fui a primeira daquele turno de testes. Acho que havia umas 10 pessoas na fila para o tampone (como chamam os testes aqui). Dava para perceber perfeitamente quem estava ali por conta do teste: os únicos de máscara na farmácia. Desde sábado retiraram a obrigatoriedade do uso de máscaras, inclusive nos transportes públicos (acho que o uso segue sendo obrigatório em hospitais/centros médicos).

Fui a primeira a fazer o teste. O moço perguntou por qual motivo estava ali. Expliquei que meu marido e meu filho estavam positivados e que durante a noite havia tido alguns sintomas estranhos. Ele esboçou uma expressão de "ixi!" e logo mandou que esperasse alguns minutos fora da farmácia.

Povo que chegava e reclamava da fila, povo que chegava e ficava grudado na gente (eu dava um passinho para o lado, quase que dizendo "não sou antipática não! Mas é que talvez esteja com covid ..."). As senhorinhas que insistiam em puxar papo. Os cúmplices que haviam feito exame no mesmo turno que se olhavam resignados ...

Uns 20 minutos depois o mesmo moço que havia coletado o exame saiu com umas quantas folhas na mão.

- "Fulano de tal, entra e assina um documento pra mim. Ciclana de tal, entra também e assina pra mim. Mariazinha das Candangas, tá liberada, pode ir embora. Luizinho da Silva, entra e me dá um autógrafo também."

Assim ele foi chamando um por um - eu fui a última a ser chamada. A única liberada foi uma senhora de uns 80 e tantos anos. A única que o exame havia dado negativo. Sem mentira nem exagero: todos os outros positivados. Inclusive eu.

Fui a última a dar autógrafo para o moço da farmácia. Ele me olhou com cara de "que droga, né?!". Assinei um papel do serviço sanitário daqui, ele me explicou que precisava fazer isolamento - sem sair de casa - por 5 dias. Logo tenho que repetir o exame. Em caso de resultado negativo, estarei livre. Em caso de positividade terei que fazer mais alguns dias de isolamento (nem lembro quantos porque comecei a ficar meio zonza) e logo repetir o exame.

Enviei uma foto do resultado para o marido, logo uma figurinha com rostinho furioso.

Obrigada!

Não. Não é um "agradecimento" aos meus meninos ... afinal, eles não tem culpa. Foi um GRACIAS assim gigante e irônico para o Universo mesmo. Eu esqueço que ele é detalhista e brincalhão.

P.S.: de todas formas o pedido para as Maldivas está bem detalhadinho e registrado aqui no blog, viu?! 


" ... na saúde e na doença ..."


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