A Fada do Dente.

      Nos encaminhávamos para o final de domingo.

    Havia sido um final de semana relativamente tranquilo, havíamos conseguido organizar (ou dar o primeiro passo para organizarmos) algumas coisas ainda pendentes da casa.

    Estávamos (eu e meu Amore) no quintal, plantando algumas novas plantinhas, limpando e fazendo novos projetos. Com a proximidade da primavera a gente se anima para esses novos planos.

    Fazia pouco tempo que Pequeno havia saído de casa. Pegou a bicicleta e foi para o Oratório (um local da igreja que eles dedicam para diversas atividades, encontros, esportes, colônia de férias, etc) para participar de um campeonato de basquete.

    Você me pergunta: "Ué, Tatiana?! Mas eu nem sabia que Pequeno jogava basquete ..."

    Nem nós. E provavelmente, nem ele.

    Não passaram-se 30 minutos da saída dele de casa. Ainda estava com as mãos cheias de terra do jardim, marido varrendo o quintal, quando recebo uma vídeochamada pelo WhatsApp. Era Pequeno:

    - "Ôoooo mãe! Olha o que aconteceu!"

    No início havia entendido que Pequeno havia levado uma bolada no rosto (e bola de basquete dói pra caramba!). Só fui entender o que realmente havia acontecido quando ele voltou pra casa.

    Pequeno havia quebrado os dois dentes da frente, os superiores, os dentões. Um deles quase totalmente perdido (quebrado) e o outro uns 60% de dano

    Eu entrei em pânico.

    Eu sempre tive trauma com dentes (os meus). Desde muito pequena, sofro indo em dentistas. Meus dentes são frágeis. Além disso - acho que já devo ter contado por aqui alguma vez - não tenho 7 dentes: os 4 sisos (que nunca nasceram - e nunca nascerão, já constatado por oitoscentas mil radiografias). Além deles, não tenho 3 dentes inferiores (não os perdi ou arranquei, simplesmente eles nunca nasceram mesmo. E assim como os sisos, não existem). Um caso raro.

    Tive muitos sonhos com dentes caindo. Quando digo que tenho trauma com dentes não falo de uma maneira exagerada. É trauma mesmo.

    Por isso sempre zelei e cuidei dos dentes do Pequeno quando este compito era somente meu (nosso, no caso do pai dele também). Quando Pequeno passou a ser independente, me transformei naquela  mãe chata que acordava para saber se o menino havia escovado os dentes antes de dormir.

os primeiros dentinhos



o primeiro dente que caiu

o primeiro dentão que caiu

    Torrava a paciência dele falando sobre a importância da higiene bucal, da limpeza, das cáries, etc.


    Fiquei feliz da vida que há alguns meses  quando fomos fazer um controle e exames para que Pequeno colocasse aparelho para alinhar os dentes, a dentista disse que estava tudo ótimo, sem nenhuma cárie.

    - "Que alívio!", pensei.

    Para de repente, num domingo qualquer, o menino voltar pra casa desdentado.

    Eu chorei muito. Chorei a ponto de passar mal. Fiquei desesperada, triste, agoniada. Pode parecer exagero, afinal existe coisa bem pior nessa vida - e sou bem consciente disso - mas também era consciente da trabalheira e cuidado que esse menino vai ter pro resto da sua vida.

    - "Os dois dentões da frente! Não pode ser ...", chorava desesperada dentro de casa enquanto marido tentava me acalmar, mas com cara de desespero também.

    Podia ser sim. Tanto podia que havia acontecido.

    Ele chegou em casa, com o rosto meio assustado, tentando acalmar o que nem ele sabia direito como. Então explicou que havia sido uma cotovelada, logo no início do jogo. Uma coisa sem sentido, sem querer, sem explicação que ele nem sabia direito como havia ocorrido. Tanto que ele nem havia se dado por conta de que estava com os dentes quebrados. Alguém o avisou e só então ele percebeu os dois pedaços de dente no chão.

    Por sorte, teve o intuito de juntá-los. Chegou em casa com os dentes guardados na capa do celular.

    Ligamos imediatamente para a dentista que está seguindo o tratamento ortodôntico dele. Mandamos foto e logo escutamos um "putz!". Nem precisava de uma palavra muito elaborada para gente confirmar o que já sabíamos: deu ruim!

    Mas, segundo ela, dos males o menor. Ainda bem que ele havia juntado os dois pedaços de dente. Pediu que os colocasse num pote com soro fisiológico e deixasse ali até o dia seguinte. Ela tentaria encaixá-lo de alguma maneira na sua agenda e avaliar o que poderia ser feito.

    Preciso ser muito sincera e dizer que não conseguia olhar direito para meu filho. Me causava dor, me causava pena. Ao mesmo tempo me sentia ridícula sabendo que existem problemas bem piores na vida do que dente quebrado. No caso, dentes. Porque com o Pequeno é assim: pra quê quebrar só  um se posso quebrar os dois?

    Uma amiga me ligou para saber o que havia acontecido (o filho dela estava com Pequeno). E então aprendi uma nova palavra em italiano que vou levar comigo para o resto da vida: rogna.

    - "Ufff ... questo è una rogna per tutta la vita ..."

    Existem vários significados para esta expressão. Mas basicamente o que ela quis dizer é que será um aborrecimento, para sempre.

    Marido não dormiu a noite inteira, pesquisando sobre dentes e o que poderia ser feito. Eu fiquei com um aperto no peito achando que teria um piripaque a qualquer momento. Pequeno, pelo visto, dormiu bem. Provavelmente com dor, provavelmente preocupado, mas dormiu.

    Na manhã seguinte, segunda-feira, eu e marido precisávamos resolver umas burocracias em Milão logo cedo. Marido achou melhor que ele não fosse à escola. Primeiro por questão de vergonha mesmo, não era uma cena legal de se ver (para os colegas seria ótimo, teriam risadas garantidas cada vez que Pequeno abrisse a boca) e também porque poderíamos ser chamados no consultório da dentista a qualquer momento.

    Voltei de Milão e Pequeno agradeceu por não ter ido à escola:

    - "Acho que não ia ser muito legal, né ... sair assim ..."

    Almoçamos. Pequeno comeu um creme de cenoura, nem muito quente e nem muito frio para evitar traumas nos dentes. E logo saímos para a consulta. Peguei o potinho com os pedaços de dentes banhados em soro e fomos, com o coração apertado.

    Demorou pra caramba mas a dentista conseguiu colar os pedaços de dentes e remodelar basicamente como eram antes do acidente. Óbvio que não ficou exatamente como eram mas ela fez o que pode. Isso sim: una rogna per tutta la vita.

    Precisa ter muito cuidado com o que come (sobretudo como morde), corre o risco de eles quebrarem novamente, afinal não existe nenhum tipo de cola 100% eficaz. Além disso, precisa fazer controles periódicos para avaliar a saúde do dente. Segundo ela, ainda é cedo para dizer que está tudo ok com as raízes dos dentes, por exemplo. Esse tipo de trauma nos dentes pode evoluir negativamente até mais ou menos um período de dois anos. Basicamente precisamos ter todo o cuidado possível para que o dente "não morra".

    Como boa mãe desesperada, já fico pensando que num futuro ele não terá dinheiro para fazer implante (e nem é exagero, porque os dentistas aqui são caros) e ficará desdentado ... tão bonitinho que era ... coitadinho!

    O tratamento ortodôntico está bloqueado por algum tempo. Até ela ter certeza de que o aparelho não afetará os dentes traumatizados com o acidente. Tratamento, aliás, que já pagamos. Não basta doer no coração, tem que doer no bolso também.

    Já disse pra ele pensar na possibilidade de estudar odontologia ... tem os dentes dele (e os meus) garantidos ...

    Pequeno está tentando se acostumar com a nova sensação que tem na boca.

    - "É estranho! Porque parece que não são meus dentes ..."

    E não são mesmo. Entre um pedaço de dente e outro tem cola e outros tantos materiais diversos que a dentista teve um super trabalho para consertar.

    Veremos quanto tempo dura ... 

    Eu havia pensado que o acidente que ele teve de bicicleta na semana passada (ele quase atropelou a porta de um carro que se abriu de repente, desviou e acabou batendo de cabeça num muro) havia sido o ápice das Pequenice's ...

    ... mas se tem uma coisa que as mães precisam aprender é que os filhos sempre surpreendem. E com o Pequeno, no caso, não existe monotonia.

    Una rogna ... per tutta la vita ...



5 comentários:

  1. Uma aventura não muito agradável…☺️ um beijo da tia Eliane

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  2. Aprendizado, e tudo resolvido.. bjus do Tio Tenato.
    OIM - OMB

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  3. Meu afilhado desdentadoooooo!!!! Judiariaaaaaaa!!!! Mas, vai dar bom e os dentes dele vão permanecer vivinhos da Silva! \o/
    Beijos da dinda mais linda dele! Tô aqui na torcida para que fique tudo bem! 💙

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  4. Gente 🥺
    Mas Pequeno anda azarado: Uma semana abrem a porta do carro e ele vai ao muro. Outra semana em jogo de basquete quebra os dentes da frente: Meu Deus. Mas vai dar tudo certo. Os dentes não quebrarão mais. Se cuida... Abraços família

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  5. Caramba!! Nicolinha vivenciou uma maré de má sorte! Eu também morro de agonia com os dentes e faço o impossível para não ter que ir ao dentista (agora coloquei aparelho e todo mês eu vou). Mas vai dar tudo certo com os dentões! Acalma teu coração que vai dar tudo certo no final!! 🤩😘🦷

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